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11 de Julho 2013, 01h04
Cavaco fez um discurso confuso, que exigiu umas horas de trocas de impressões entre comentadores até se conseguir uma leitura minimamente consensual sobre o que o presidente tinha dito. Em momento de crise, valia a pena ter feito um maior esforço de clareza.
Cavaco fez com este discurso a sua própria moção de censura ao Governo. Cavaco explicou que só não convocava eleições antecipadas imediatamente devido ao “resgate” em curso. Mas informou que, mal a oitava avaliação termine, as convocará sem hesitar. Este Governo não lhe parece de confiança. É provisório. Não se percebe como é que "os mercados" devem confiar nele se o presidente não confia.
Cavaco desautorizou e humilhou Pedro Passos Coelho, a quem não reconheceu as capacidades de liderança, de negociação e de intermediação necessárias numa fase grave da vida nacional. Cavaco permitiu mesmo que o PM pensasse que ele, Cavaco, iria aceitar o último modelo de remodelação governamental e que esta sua comunicação ao país serviria para a anunciar. Cavaco não deixou sequer Passos Coelho fazer a sua remodelação. Cavaco acha que não pode confiar o governo ao primeiro-ministro. O que pode fazer Passos Coelho? Demitir-se? Depois do “Não me demito.”?
Cavaco desautorizou e humilhou Paulo Portas (recusando-lhe a promoção que ele e o seu partido tinham como garantida), obrigando-o a manter-se no Governo sem nenhuma das vantagens territoriais que tinha conseguido à custa do seu recuo. Portas não lhe parece digno de mais responsabilidades nem de uma vitória política. O que pode fazer Paulo Portas? Demitir-se de novo? Publicando um comunicado dizendo que desta vez a sua decisão é… irrevogável?
O Governo está hoje mais frágil do que antes e não pode merecer a confiança ou o respeito de ninguém. É, de facto, um Governo de gestão, com capacidade diminuída, que fica à espera do momento da saída, em Julho de 2014, e que perdeu estrepitosamente o apadrinhamento do seu maior apoiante. O programa político do governo é, agora oficialmente, o memorando da troika e o programa do segundo resgate. As negociações com a troika serão aliás levadas a cabo por uma pessoa muito lá de casa, a ministra Maria Luís Albuquerque. E Cavaco passou a ser o dono do Governo. Alguém se conseguirá demitir?
Cavaco sabe que vai ser necessário um segundo resgate e quer prender o PS à assinatura desse resgate, tal como esteve preso ao memorando da troika. O que pode fazer Seguro, depois de ter jurado mil vezes a pés juntos que iria cumprir o memorando e pagar tudo o que devemos?
Se o PS aderir ao acordo – e é provável que o “negociador” que Cavaco vai nomear para o representar proponha um acordo mínimo, irrecusável – a liderança de Seguro ficará esvaziada e o partido dividido em dois. O PS resistirá? Ou parte? E que argumentos poderá Seguro invocar para não assinar um "acordo de salvação nacional" que contenha algumas daquelas frases ocas que ele costuma dizer?
E o PSD, amarrado por natureza ao Governo e ao memorando, com um acordo tripartido que lhe irá retirar toda a margem de manobra, resistirá a um segundo resgate e a mais austeridade? Mesmo quando já não tiver benesses para distribuir pelos amigos? Ou parte?
Com que programas se apresentarão às eleições antecipadas os três partidos PSD, PS e CDS se assinarem o acordo? Todos apresentarão o mesmo programa? Cada um deles irá criticar os outros dois por terem assinado o acordo?
O PCP e o BE conseguirão alargar a sua base de apoio de forma significativa? Quantos partidos e que partidos haverá daqui a um ano?
Cavaco parece ter recuperado há algumas semanas as suas capacidades mentais e demonstrou hoje a sua capacidade para ocupar o centro do tabuleiro político e para dar um abanão ao espectro político. Para fazer de eucalipto, como só ele sabe.
Há aqui alguma oportunidade para alguma coisa interessante? Há. As pessoas do CDS e do PSD com alguma independência de espírito, que recusam a subserviência perante a troika e que não gostaram de transformar o país num capacho para os bancos limparem as botas podem encher-se de brio e mostrar o seu patriotismo.
O PS pode aproveitar para sacudir o seu líder (antes ou depois de ele assinar o acordo tripartido). E a esquerda pode aproveitar a oportunidade para a) demonstrar como é importante ter uma alternativa e b) construir essa alternativa.
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