por José Vítor Malheiros
Texto publicado no jornal Público a 10 de Março de 2009
Crónica 8/2009
O grau mínimo do apoio do Estado à imprensa deve consistir na promoção da leitura de jornais
Sendo a imprensa essencial à democracia e havendo uma crise da imprensa, parece razoável que - pelo menos entre quem se preocupa com a democracia - haja preocupação em resolver essa crise.
Entre as medidas que nos últimos tempos se re/começou a discutir estão os apoios do Estado à imprensa. As pessoas reagem aos apoio do Estado, antes de mais, de acordo com a sua inclinação ideológica ("o Estado pode ser parte de solução" versus "o Estado é sempre parte do problema") e muitos, dos dois lados do espectro político, opõem-se com desconfiança a apoios que poderiam instrumentalizar os media. O receio é compreensível.
Mas a verdade é que há inúmeras coisas que o Estado pode (e deve) fazer e que não põem minimamente em risco a liberdade de imprensa e a pode até reforçar (é, aliás, precisamente por isso que o Estado as deve fazer).
Uma das coisas que o Estado deve fazer é promover a imprensa - mais uma vez, porque a imprensa é um dos fundamentos da democracia. Promover a imprensa não significa financiar directamente os órgãos de comunicação social - o que é de evitar e pode ser evitado.
O grau mínimo de apoio do Estado deve consistir na promoção da leitura de jornais, através de campanhas dirigidas a jovens, à população em geral e a grupos específicos. Mas isso também pode (e deve) ser feito através de compras regulares de jornais por vários organismos públicos (escolas, bibliotecas, etc.), com base em critérios claros.
As regras da acção do Estado devem ser a transparência de todos os processos; a definição de critérios através do debate democrático; a competência e a independência dos responsáveis escolhidos para dirigir todos os programas e projectos; a criação de instâncias que garantam o isolamento destes programas dos órgãos políticos (buffering); e o controlo público. Se for assim, o risco de manipulação pode ser minimizado.
Outras medidas que o Estado pode (e deve) lançar incluem programas de investigação e desenvolvimento em parceria com as associações industriais e profissionais do sector. Esta é uma área que o Estado tem negligenciado - algo indefensável perante o actual panorama de revolução tecnológica e perante os protestos de apoio à "sociedade do conhecimento" e à "produção de conteúdos em português". Além de que também podemos (e devemos) perguntar por que razão o Estado não apoia um programa de modernização da imprensa - quando o faz (melhor ou pior) em tantos outros sectores. Este apoio poderia (e deveria) estender-se à realização de estudos (tecnológicos, de mercado, etc.) regulares, a partilhar por todo a sector.
Pode dizer-se que já há programas a que as empresas e associações se podem candidatar - e há. Mas, perante um panorama de escassa iniciativa privada e de depressão instalada nas empresas de media, uma competente acção de intermediação (brokerage) por parte do Estado poderia dar consistência ao que são hoje estudos avulsos e de utilidade duvidosa. O Estado pode (e deve) convidar os interessados a sentar-se à volta da mesma mesa.
O Estado pode (e deve) criar programas de formação avançada para jornalistas em exercício (e outros profissionais da imprensa). E o Estado pode (e deve) apoiar a criação de infra-estruturas. É lamentável que as escassas bases de dados de imprensa existentes - infra-estruturas de uso comum preciosas para a imprensa, mas também para o ensino, a investigação e até a administração pública - tenham sido criadas tão tarde entre nós e tenham uma utilização tão limitada.
Não seria difícil acrescentar umas ideias a esta lista. Jornalista (jvm@publico.pt)
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