por José Vítor Malheiros
Texto publicado no jornal Público a 31 de Março de 2010
Crónica 13/2010
Texto publicado no jornal Público a 31 de Março de 2010
Crónica 13/2010
Já repararam nos frisos de homens brancos vestidos de cinzento e azul nas mesas-redondas sobre tecnologias de informação?
O problema da representatividade dos géneros nas várias profissões não é apenas um problema de igualdade cidadã e de liberdade de acesso, ainda que estas sejam questões fundamentais. É também um problema de acesso, nas várias actividades humanas, ao reservatório nacional (e mundial) de talento.
Em termos internacionais, Portugal não está mal situado na representatividade dos géneros nas profissões científicas, com 20.000 homens e 15.000 mulheres a representar os recursos humanos dedicados à ciência e à tecnologia, dos quais 15.800 investigadores homens e 12.300 investigadores do sexo feminino (dados de 2007 em Equivalente a Tempo Integral). No entanto, a distribuição dos géneros faz-se de forma desigual e se há áreas onde já há predomínio de mulheres (nas biociências, por exemplo), existem outras que são ainda maioritariamente e às vezes esmagadoramente masculinas. A engenharia é uma destas.
A Ordem dos Engenheiros tem entre os seus membros efectivos 7523 engenheiras e 31.543 engenheiros (1 para 4) e a relação é pior em certas especialidades: se considerarmos só os engenheiros informáticos e electrotécnicos a relação é de 679 para 7620 (ou 1 para 11). Isto significa que o mundo das tecnologias de informação está dominado pelos homens, como aliás é fácil de constatar em qualquer empresa ou departamento universitário de informática ou em qualquer das reuniões científicas sobre estas áreas, sempre tristemente masculinas. As tecnologias de informação são o domínio do E-Male.
Há quem pense – como o antigo reitor da Universidade de Harvard, Lawrence Summers – que o facto se deve às menores capacidades científicas e tecnológicas das mulheres e, em particular, a uma aversão de origem uterina pela matemática, mas a ideia já não está tanto em voga como esteve (como o prova o facto de Summers ter sido forçado a demitir-se em 2006, um ano depois de ter proferido as suas inesperadas considerações sexistas) e existem inúmeras demonstrações do contrário.
O problema que existe é que – para além dos eventuais factores que estejam a limitar a liberdade de acesso das mulheres e a discriminá-las de facto –, nesta área que consideramos central para o desenvolvimento social e económico, só estamos a explorar a imaginação, as questões, as dúvidas, as abordagens e as soluções de metade das pessoas possíveis. Pior: a metade que estamos a utilizar é dramaticamente homogénea (seria menos grave se o nosso universo de escolha fosse formado por metade dos homens e metade das mulheres).
Já repararam nos frisos de homens brancos de 40 anos vestidos de cinzento e azul, que se sucedem nas mesas-redondas sobre Tecnologias de Informação e Comunicação dos nossos congressos, que um marciano tomaria facilmente por clones? A versão optimista é que o seu aspecto gráfico é igual mas as suas mentes são maravilhosamente diferentes… mas serão suficientemente diferentes?
Pessoalmente, acho que as mulheres e os homens pensam de facto de maneira diferente e a minha experiência diz-me que a riqueza criativa de grupos diversos é muito maior que a de grupos homogéneos. E criatividade e diferença é algo de que precisamos desesperadamente – principalmente numa área tão moldadora do futuro como as TIC.
Da mesma maneira que a política é uma coisa demasiado importante para ser entregue aos políticos, a tecnologia é uma coisa demasiado importante para ser entregue apenas aos homens. (jvmalheiros@gmail.com)
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