por José Vítor Malheiros
Texto publicado no jornal Público a 4 de Março de 2010
Crónica 9/2010
Texto publicado no jornal Público a 4 de Março de 2010
Crónica 9/2010
O leitor fiel de um só jornal morreu e já não vai ressuscitar
O principal tema abordado nos artigos publicados sobre o último inquérito feito nos EUA pelo Pew Internet & American Life Project (http://www.pewinternet.org) foi o facto de a Web se ter tornado uma fonte de notícias mais importante para os leitores americanos do que os jornais em papel ou a rádio. O facto vinha-se fazendo anunciar há tantos anos que só os muito distraídos terão fi cado surpreendidos, mas o marco é sem dúvida importante e é inevitável que a vaga se vá estendendo a todos os outros países. A percentagem que diz usar a Web para se informar é de 61 por cento e a percentagem para rádio, jornais locais e jornais nacionais é, respectivamente, de 54%, 50% e 17%. A televisão, porém, ainda aparece à frente de todos os meios neste ranking.
O que mais ressalta deste estudo (Understanding the participatory news consumer) é, porém, o carácter social desta actividade de consumo de informação.
O que quer dizer “carácter social”? Várias coisas. Por um lado, reforçando aquilo que outros estudos têm apontado, as pessoas interrogadas indicam como primeira razão para o seu consumo de informação “poder falar com outras pessoas sobre o que se passa no mundo” e como segunda razão o facto de estar informado ser “um dever cívico”. Só depois aparece a motivação devido ao valor utilitário ou de entretenimento da informação.
Decorre daqui – e isto está longe de ser uma novidade mas é um factor quase sempre esquecido pelos media – que a informação é tanto mais apreciada quanto mais partilhada for.
O que é mais importante (e daí o título) é que o estudo diz que 75% dos consumidores de informação online dizem aceder a notícias através de links que recebem por mail ou através de redes sociais, enquanto 52% afirmam difundirem as notícias que acham interessantes através desses mesmos meios. Outros dados colhidos no estudo reforçam esta ideia de que o consumo de informação é eminentemente uma experiência social – com a partilha, reenvio, comentário e discussão de notícias a ocupar um papel cada vez mais importante.
Finalmente, o estudo do Pew Research Center reforça mais uma vez a morte da figura do “leitor fi el” de um título, com a esmagadora maioria dos interrogados (92%) a usar várias plataformas para aceder a notícias e a consultar vários títulos e sites por dia.
O que significa isto? Entre outras coisas significa que os sites que apostam (ou vão passar a apostar) na restrição do acesso aos seus sites mediante assinaturas fazem isso por sua conta e risco e vão provavelmente passar um mau bocado. Não me parece que um modelo de negócio baseado em assinaturas seja sempre insustentável, mas do que tenho a certeza é de que ele não será a regra e muito menos uma solução.
Fechar um conteúdo significa reduzir a sua participação nesta troca social que é, cada vez mais, a forma como consumimos informação e fazer isso é condená-lo à irrelevância.
Se não for fácil localizar a informação, pesquisá-la, citá-la, referenciá-la, enviá-la, lincá-la, comentá-la, inserila em outros meios (blogues, redes sociais) o seu valor de uso reduz-se drasticamente. As próprias redes sociais estão aliás a perceber isso, havendo uma tendência para a adopção de tecnologias que facilitem a troca de informação e o tráfego de utilizadores entre todas elas.
Num mundo onde a informação é cada vez mais um bem social, partilhável, quem recusa esse estatuto e se quer transformar num clube privado e selecto, morre. A informação deixou de ser uma mercadoria para ser um movimento, um diálogo. E quem não percebe isso devia ir vender batatas.
O que os media deveriam estar a fazer era pensar de que forma poderão viver neste mundo reforçando essa experiência social de partilha (e também de produção) de informação e não na forma como podem adiar a sua morte, trancando as portas face ao tsunami. (jvmalheiros@gmail.com)
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