por José Vítor Malheiros
Texto publicado no jornal Público a 11 de Setembro de 2001
Crónica x/2001
Porto Santo é, sem dúvida, uma das mais belas praias de Portugal e seria justamente colocada em qualquer "ranking".
A longuíssima extensão de areia fina, a qualidade da água, o manso mar azul turquesa, os ilhéus rochosos que enquadram a praia fazem de Porto Santo um destino de férias de sonho. O maior trunfo da ilha é o seu clima sub-tropical, com um Sol sempre quente mas nunca demasiado violento, com uma água sempre tépida mas sempre refrescante.
A paisagem natural da ilha para além da costa não é particularmente sedutora, com o seu perfil rochoso e agreste, mas oferece aqui e ali atraentes perspectivas, que reforçam o seu ar de oásis selvagem no meio do oceano.
Não espanta por isso que, desde há alguns anos, Porto Santo seja apresentada ao turismo como uma pequena jóia, um paraíso de férias de uma imensa beleza natural. A reputação é merecida e nenhum veraneante se sente defraudado com a escolha.
O que é alarmante em Porto Santo, é constatar que tudo o que é bonito na ilha foi uma oferta da natureza e que tudo o que é intervenção humana a desfeia.
É verdade que a costa da ilha não está (ainda?) cimentada à algarvia, mas a construção em Porto Santo (e não só em Vila Baleira) apresenta o mesmo padrão de desordenamento urbano que vemos um pouco por todo o país e faltam na ilha aqueles sinais exteriores de civismo a que os seus habitantes e visitantes têm direito. Os passeios são escassos, as estradas não têm a mínima berma que permita acomodar um passeante e toda a ilha é uma tortura para alguém que tenha de empurrar um carrinho de bebé (devido às características da praia as famílias são abundantes). A ilha poderia ser um paraíso para passeios de bicicleta mas não há uma única pista para ciclistas. O sistema de transportes públicos (autocarros) é praticamente inexistente e os horários são respeitados com uma parcimónia mais índica que atlântica. E é em vão que se procuram os parques, as esplanadas, os jardins, as árvores de sombra que a ilha está mesmo a pedir. Será que isso acontece porque as autoridades regionais querem manter a ilha na sua rudeza original, como um local de férias selvagens para os amantes da aventura? Também não. A ilha é cada vez mais invadida pelos carros e, na falta das devidas estruturas (parques ao pé das praias, por exemplo), o estacionamento é cada vez mais selvagem e chega a transbordar das beiras das estradas para os escassos passeios.
A erosão e o desaparecimento do coberto vegetal da ilha é outro dos graves problemas. Com o desaparecimento praticamente total da agricultura nas últimas décadas, as zonas de vinha e de outras culturas transformaram-se em pedregais poeirentos que esperam a sua vez de ser ocupados por construções de gosto duvidoso. Seria bom que se compreendesse que a actividade agrícola não é importante apenas pela produção directa, mas devido à gestão da paisagem que realiza.
Não há razão para considerar que o Porto Santo esteja desde já perdido. Mas a verdade é que é em vão que se procura um sinal de esperança no meio do caos da construção e do desordenamento da paisagem.
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